Hoje tinha tudo pra ser um dia monótono, mas ao chegar na faculdade soube que iriamos assistir um filme. Não me interessei muito no começo, nem pelo nome-A flor do deserto-nome que parece de sofrimento, fome, miséria, realidade que sabemos e que pouco podemos ajudar.
Um filme baseado em uma história real, descrevendo a vida de Waris Dirie, descendente de uma família nômade do deserto da Somália, que com apenas cinco anos, foi submetida à mutilação genital feminina. E é exatamente essa história de dor, de tristeza, mas também de superação que sustenta a narrativa desse filme. Quando completa os 13 anos ao ser forçada a se casar com um homem bem mais velho que ela, Waris foge, atravessa o deserto, enfrenta uma tentativa de estupro, e assim consegue chegar à capital somali, Mogadíscio, onde reencontra sua avó, que tentando protegê-la a envia para Londres, onde passa sua adolescência trabalhando como empregada doméstica, na embaixada da Somália, que é fechada quando se inicia a Guerra Civil neste país africano.
Sozinha e sem ter para onde ir, Waris (interpretada pela modelo e atriz etíope Liya Kebede) passa a morar nas ruas, até o dia em que conhece a vendedora Marylin (Sally Hawkins), e com a ajuda dela consegue abrigo e também emprego em uma lanchonete, onde é descoberta pelo famoso fotógrafo de moda Terence Donovan, e rapidamente se torna uma celebridade internacional.
Mas o que era poderia ser mais um “conto de fadas”: a garota nômade que se torna top model, mostra-se uma história comovente, apresenta as diferenças culturais entre Waris e Marylin, as dificuldades que Waris tem em lidar com o próprio corpo, com sua sexualidade, e sua luta por uma vida melhor. Nesse processo, pode-se indicar dois momentos cruciais mostrados no filme, quando ela decide buscar ajuda médica e posteriormente, quando resolve contar sua história de vida a uma jornalista no auge de sua carreira, e também numa conferência da Organização das Nações Unidas.
A imagem acima mostra a reportagem onde Waris revelou sua história para revista Marie Claire em 1996
Essa fala e as lembranças que ela evoca na personagem constituem a mensagem principal desse filme: seu posicionamento firme e crítico sobre a mutilação genital feminina. E é em memória de suas duas irmãs que morreram e também por ser uma sobrevivente, que Waris clama para que essa violência seja abolida, pois apesar de não constar no Alcorão (escritura sagrada do Islã), esse procedimento ainda é praticado em nome da religião.
Que a coragem de Waris Dirie nos sirva para refletir e questionar nosso lugar como mulher, que sua experiência pessoal contada neste filme (lançado em 2010 e dirigido por Sherry Hormann) e no livro homônimo publicado em 65 edições e com mais de 11 milhões de cópias vendidas; mas principalmente, sua atuação política seja inspiração para todas as mulheres.
Desde 1996, quando foi nomeada embaixadora especial da ONU para a eliminação da Mutilação Genital Feminina, ela tem viajado pelo mundo, para participar de conferências sobre o assunto e buscar apoio de líderes nacionais, vencedores do Prêmio Nobel e estrelas internacionais para essa importante causa.
Em 2002, ela criou a Waris Dirie Foundation, com sede em Viena/Áustria, para apoiar seu trabalho contra a Mutilação Genital Feminina. Em 2010, a Fundação foi re-nomeada "Desert Flower Foundation" para refletir uma abordagem mais ampla no combate a esse tipo de violência contra as mulheres, que segundo estimativas da Organização Mundial de Saúde (OMS), atinge 150 milhões de mulheres em todo o mundo, principalmente em regiões do continente africano, no Oriente Médio, no Sudeste da Ásia - e também entre os imigrantes na Europa.
Tipos e consequências
A OMS distingue quatro tipos diferentes de Mutilação Genital Feminina (MGF): o tipo 1 é a remoção total ou parcial do clitóris; o tipo 2 é a retirada do clitóris e dos pequenos lábios; o terceiro tipo envolve o estreitamento do orifício vaginal pela criação de uma membrana selante, corte ou aposição dos pequenos lábios e/ou dos grandes lábios (a chamada infibulação); o tipo 4 é qualquer outra forma de intervenção por razão não médica. Os primeiros dois tipos correspondem a 90% das ocorrências de mutilação, segundo dados da OMS.
Além das dores e hemorragias, as consequências do procedimento a longo prazo podem incluir dor crônica, infecções, diminuição do prazer sexual e outros danos psicológicos, como stress pós-traumático. As mulheres vítimas de mutilação genital também tem um maior risco de complicações durante o parto, com maior incidência de cesariana e de hemorragias, o que eleva entre elas o nível de mortalidade dos bebês, que é 55% maior.
Desigualdade de gênero
De acordo com uma declaração conjunta da OMS e diversas instituições ligadas aos direitos humanos, publicada 2009, “em todas as sociedades que é praticada, a mutilação genital feminina é uma manifestação de desigualdade entre sexos, profundamente enraizada e constitui uma forma extrema de discriminação contra as mulheres”.
Diversas razões justificam a manutenção dessa prática, como por exemplo, ser considerada um rito de preparação para a vida adulta; uma condição que mantém a virgindade, pré-requisito para o casamento, assim como a honra e a linhagem familiar, visto que somente as mulheres excisadas são consideradas aptas para o casamento; assegura a higiene e limpeza das meninas com a remoção dos órgãos genitais, considerados feios e sujos.
Em sociedades muçulmanas nas quais essa prática é realizada, acredita-se que esta é requisito do livro sagrado. Contudo, assim como retratado no filme, também líderes e estudiosos confirmam que não há no Alcorão qualquer referência à mutilação genital feminina.
Além dessas razões, também as que se referem à sexualidade são significativas para justificar a continuidade da MGF. Pois, em algumas comunidades, acredita-se que ela reprime o desejo sexual e previne um comportamento desviante e imoral das mulheres; Também há uma crença de que aumenta o prazer sexual masculino, prevenindo o divórcio ou a infidelidade.
Acerca dessas justificativas, Waris Dirie em entrevista ao site G1, em 2010, afirma “Não tem nada a ver com religião. Todas as meninas que são vítimas de FGM [mutilação genital feminina, na sigla em inglês] também são vítimas do casamento forçado. A maioria é vendida quando criança a homens mais velhos. Eles não pagariam por uma noiva que não é mutilada. É uma vergonha para nossas comunidades, para os países que permitem a prática. Os homens temem a sexualidade feminina, essa é a verdade", explica Dirie.
Fonte:http://mostrasemira.blogspot.com.br/
Um filme que mudara muito sua maneira de pensar... Surpreendente...
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